Futuros Antigos (Modernidade Ultrapassada - parte 4)
Sobre futurismo retrô e hábitos sociais
Acho que vou ter que mudar o perfil deste blog para “confissões de um tecnófobo deslumbrado”. Não levem a mal, é só que às vezes a gente está tão envolvido numa coisa que certas fichas não chegam a cair. Neste último fim-de-semana, fiz pela primeira vez uso de um programa que há muito tempo deixou de ser novidade: o Skype. Conversei com uma amiga em Londres, e mais tarde com outra em Curitiba, com transmissão em tempo praticamente real de som e imagem.
De repente, lembrei de algumas séries de ficção que assistia na infância: o tal de “videofone”, em que um coronel do exército americano conversava diretamente com os super-heróis da Sala de Justiça, parecia um aparato avançadíssimo, e no entanto soa tão banal já neste segundo parágrafo. Achei divertido, porém, pensar nessas coisas a este ponto. Nem tanto um deslumbramento, portanto, mas um exercício de reflexão sem maiores conseqüências.
Aí comecei a lembrar de outros avanços “previstos” na produção ficcional com que tive contato até agora. Alguns foram alcançados, outros não, outros nem chegaram a ser vistos como avanços, obsoletos em conceito antes mesmo de qualquer desenvolvimento apontar em sua direção. Uma adaptação, aliás, que gostaria de ver na tela, é a série de quadrinhos Terminal City (1997), criada e escrita por Dean Motter e brilhantemente desenhada por Michael Lark. Os carros voadores da realidade estabelecida na história tinham um design com referência das décadas de 30/40. Os cargos administrativos eram todos ocupados por robôs feitos de aço e ferro pesado, corpo cilíndrico enorme e cabeça esférica de lâmpada, bem diferente do conceito de agilidade, leveza e portabilidade das máquinas de hoje. A forma mais abrangente de comunicação eram mensagens enroladas de papel, enviadas por tubos de ar comprimido, o mesmo sistema usado em alguns navios e submarinos.
Viagens interestelares e colonização de outros planetas são outra grande especulação longe de serem concretizadas. Se no encarte do LP With the Beatles (1964) há uma citação a pessoas em Marte ouvindo a banda na década de 90, hoje vemos esta realidade muito mais à frente – até por conta de desaceleramento da corrida espacial. Viagem no tempo, só se for subjetiva, espiritual ou metafísica. Nem pensar nos termos físicos previstos por Jules Verne ou por séries como O Túnel do Tempo, da década de 60. Por falar nesse tempo, o que dizer do cinto de utilidades do Batman carnavalesco de Adam West?
E diante da nossa perda geral de ingenuidade tecnológica, penso em como é hoje a concepção ficcional do futuro. Há, em geral, perspectivas meio apocalípticas, em que seremos obrigados a achar soluções de reconfiguração social via algum aspecto científico – genético no caso de Gattaca de Andrew Niccol (1997), virtual como em Matrix dos Wachowski (1999), ou até o psíquico-tecnocrático de Minority Report de Spielberg (2002), entre muitos outros. O interessante é que, com toda nossa aparente desmistificação acerca da tecnologia e dos seus efeitos na sociedade, hoje olhamos o futuro com certo receio, bem diferente do entusiasmo de outrora.
Consciência crítica ou um outro tipo de mistificação? Fora ou dentro do ambiente científico, essas especulações sempre existiram, com pesos bem diferentes, é claro. Pelo sim e pelo não, sempre achei melhor não pensar na tecnologia como uma entidade à parte, que se constrói independente da humanidade. Essa coisa de um sistema a que devemos simplesmente nos submeter nunca entrou muito bem na minha cabeça. Mas, enfim, talvez isto também seja uma concepção meio retrô das coisas.
Acho que vou ter que mudar o perfil deste blog para “confissões de um tecnófobo deslumbrado”. Não levem a mal, é só que às vezes a gente está tão envolvido numa coisa que certas fichas não chegam a cair. Neste último fim-de-semana, fiz pela primeira vez uso de um programa que há muito tempo deixou de ser novidade: o Skype. Conversei com uma amiga em Londres, e mais tarde com outra em Curitiba, com transmissão em tempo praticamente real de som e imagem.
De repente, lembrei de algumas séries de ficção que assistia na infância: o tal de “videofone”, em que um coronel do exército americano conversava diretamente com os super-heróis da Sala de Justiça, parecia um aparato avançadíssimo, e no entanto soa tão banal já neste segundo parágrafo. Achei divertido, porém, pensar nessas coisas a este ponto. Nem tanto um deslumbramento, portanto, mas um exercício de reflexão sem maiores conseqüências.
Aí comecei a lembrar de outros avanços “previstos” na produção ficcional com que tive contato até agora. Alguns foram alcançados, outros não, outros nem chegaram a ser vistos como avanços, obsoletos em conceito antes mesmo de qualquer desenvolvimento apontar em sua direção. Uma adaptação, aliás, que gostaria de ver na tela, é a série de quadrinhos Terminal City (1997), criada e escrita por Dean Motter e brilhantemente desenhada por Michael Lark. Os carros voadores da realidade estabelecida na história tinham um design com referência das décadas de 30/40. Os cargos administrativos eram todos ocupados por robôs feitos de aço e ferro pesado, corpo cilíndrico enorme e cabeça esférica de lâmpada, bem diferente do conceito de agilidade, leveza e portabilidade das máquinas de hoje. A forma mais abrangente de comunicação eram mensagens enroladas de papel, enviadas por tubos de ar comprimido, o mesmo sistema usado em alguns navios e submarinos.
Viagens interestelares e colonização de outros planetas são outra grande especulação longe de serem concretizadas. Se no encarte do LP With the Beatles (1964) há uma citação a pessoas em Marte ouvindo a banda na década de 90, hoje vemos esta realidade muito mais à frente – até por conta de desaceleramento da corrida espacial. Viagem no tempo, só se for subjetiva, espiritual ou metafísica. Nem pensar nos termos físicos previstos por Jules Verne ou por séries como O Túnel do Tempo, da década de 60. Por falar nesse tempo, o que dizer do cinto de utilidades do Batman carnavalesco de Adam West?
E diante da nossa perda geral de ingenuidade tecnológica, penso em como é hoje a concepção ficcional do futuro. Há, em geral, perspectivas meio apocalípticas, em que seremos obrigados a achar soluções de reconfiguração social via algum aspecto científico – genético no caso de Gattaca de Andrew Niccol (1997), virtual como em Matrix dos Wachowski (1999), ou até o psíquico-tecnocrático de Minority Report de Spielberg (2002), entre muitos outros. O interessante é que, com toda nossa aparente desmistificação acerca da tecnologia e dos seus efeitos na sociedade, hoje olhamos o futuro com certo receio, bem diferente do entusiasmo de outrora.
Consciência crítica ou um outro tipo de mistificação? Fora ou dentro do ambiente científico, essas especulações sempre existiram, com pesos bem diferentes, é claro. Pelo sim e pelo não, sempre achei melhor não pensar na tecnologia como uma entidade à parte, que se constrói independente da humanidade. Essa coisa de um sistema a que devemos simplesmente nos submeter nunca entrou muito bem na minha cabeça. Mas, enfim, talvez isto também seja uma concepção meio retrô das coisas.
10 Comments:
eu voto em os skates voadores e roupas auto-ajustáveisde "de volta para o futuro" se tornarem realidade.
hehe
bjim
Hmmmmm. O cinto de inutilidades do Adam West, francamente, não seria tão carnavalesco assim nas ruas de hoje. Adaptado para viajoras desse espaço, conteria porta-celular, porta-ipod, porta-pager, porta-bip, porta-ticket, porta-cartão...Hmmmm. "Futuros antigos"...Santa Bat-sacada, Leo!
na realidade eu sinto como se as novas tecnologias tivessem obrigação de aparecer para melhorar a nossa vida, então,quando aparece uma nova eu já penso - devia ter aparecido antes, que demora!
Hehehe. É verdade leo. Mas se tem autores e roteiristas que criaram futuros que nunca se realizaram, os que fizeram futuros que o viraram realidade ficaram meio de lado. Ler livros como Neuromancer, Mona Lisa Overdrive e Idoru de William Gibson e lembrar da Internet, da digitalização do Ser humano e dos idolos instantâneos da internet de hoje em dia é uma experiência assustadora. E vale lembrar a fantástica (e preocupante) alegoria feita lindamente em Do Androids Dream of Electronic Sheep, o romance que deu origem ao filme Blade Runner, onde as pessoas ESCOLHEM como vão se sentir hoje através de um botão numa caixa. Engraçado como isso me lembra dos nossos depressivos, anti depressivos, estimulantes e remédios para dormir...
Funny. De uma forma irônica e triste, mas enfim. :)
hmmm.... snowcrash, de mil novecentos e bolinha tem o conceito de avatar hiper desenvolvido. cabe na discussão. cryptonomicon é outro. incrusivio os dois tão se misturando aqui na minha cabeça. :|
É engraçado como as coisas partem da imaginação pra depois chegar à realidade. Talvez os que põem em prática a tecnologia não teriam gênio para inventá-la do nada. Me lembro dos Jatsons, de quanto a gente já pode encontrar nas ruas aquela realidade que, naquela época, meados de 80, parecia tão absurda. No mundo tem gente pra imaginar e gente pra concretizar. O que mais faltará ser inventado? Talvez tudo aquilo que se imaginar, por mais implausível que se pareça.
também usei o skype dia desses. o som chegava atrasado, as vezes.
não gosto de ficção cientifica.
e eu tenho medo da humanidade.
Os Jetsons...
ai que eu vivia imaginando como ia ser minha vida qd eu tivesse um guarda-roupa feito o da Judie.
Sem contar naquelas esteirinhas que levavam a pessoa pra qualquer lugar da casa.
Enfim, tudo de mais moderno.
De fato, a perda da nossa "ingenuidade tecnológica" é o que mais me chateia. Isso sem contar a obsolecência programada das coisas a nossa volta. Uma câmera digital, um aparelho de DVD, um monitor, um celular... Em pouco tempo são superados e junto com isso, uma certa ansiedade de estar "out of date", de ter expirado o prazo de validade. Por isso que eu prefiro os Jetson. Não havia essa neurose com o futuro. Nada do tipo: "Ah, estamos em 2078 e ainda não povoamos Marte, que horror...". Muito pelo contrário, era um mundo estável e bastante eficiente e que, apesar de ultra moderno, até admitia alguma quinquilharia ultrapassada, sem culpa, sem neurose. Prova disso era a Betty, a babá-robô que vivia dando pau, mas que de forma alguma era rejeitada pela família. Lembro até de um episódio em que ela ia tentar suicídio (sim, ela tinha ficado "out of date") num ferro velho, mas a família foi lá e a resgatou sã e salva.
No fundo, precisamos de mais Betties em nossas vidas...
E aí Leo, como vai a vida?... também eu utilizei o skype ontem pra falar com um velho amigo de Recife; eu agora estou en Bilbao (Espanha)... depois de 12 anos sem falar... só um par de e-mails nestes anos... e lembramos de você também, porque 12 anos atrás a gente estve juntos na Toscana, lembra?
Um abraço,
P.
(do Chile)
Muito bom ler esse texto ao som de Moby, 'The sun never stops setting', deu um ar de estar mais dentro das palavras, ou, como em uma trilha sonora mesmo, compôs melhor a idéia que estava absorvendo, consegui "entrar" mais nos exemplos.
.)
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