11 julho 2006

Cai o pano

Aspectos dramáticos de uma paixão nacional

Já deve parecer que qualquer conversa cujo assunto se relacione ao esporte nacional seja um pouco tripudiar sobre um cadáver. Por isto, este vai ser um post estranhamente curto pra quem está acostumado aos meus pretensiosos artigos. Só pra fechar um ciclo que não tive tempo de fechar antes, enfim.

Se me perguntam se gosto de futebol respondo que sou um apreciador, e não um torcedor. Gosto, portanto, porém tenho expectativas estéticas e dramáticas sobre o esporte; pra mim, trata-se de um espetáculo, e não simplesmente uma mera competição. Entendam, digo espetáculo inclusive no que diz respeito à platéia; seu envolvimento, sua torcida por um dos lados, sua projeção dentro da obra que se constrói diante de seus olhos.

Fácil saber, portanto, que me identifico com todos os brasileiros insatisfeitos com o desempenho do escrete brasileiro. De fato, não consegui mover um músculo no segundo gol contra Gana, ao fim do primeiro tempo das oitavas de final. E a postura passiva diante da inevitável desclassificação diante da França só fez piorar tudo. Mas, enfim, não é um ranço de torcedor que estou pretendendo com este texto – cada um já tem o seu, imagino.

Quando falamos de narrativa, estamos nos referindo à manifestação de um conflito: sua apresentação, seu desenrolar e, na maioria das vezes, seu desfecho. Tudo coerente com o que é estabelecido. Qualquer jornada narrativa diz respeito a um protagonista enfrentando um certo tipo de desafio. E pra isso, aquele protagonista vai ter que lançar mão de toda a sua energia pra suplantar os obstáculos e resolver seu conflito, tornando-se vitorioso. Joseph Campbell colocaria isto em termos míticos, ou seja, parâmetros genéricos de manifestações culturais expressando valores humanos. Qualquer drama passa por aí. E é isso que faz com que a platéia se interesse, se envolva, se emocione. E se decepcione, caso expectativas mínimas não sejam correspondidas: um bom final, ou, pelo menos, uma boa performance do conflito.

No nosso caso, nem uma coisa, nem outra. Deu mais gosto ver Portugal perdendo, porém com toda a raça possível, na semi-final. Deu gosto também o conflito poderoso da outra semi, entre a anfitriã e a finalmente campeã Itália. Resolução no último instante, depois de uma luta incessante de ambas as partes.

O resultado, portanto, parece-me tão importante quanto os processos. Na verdade, deve vir diretamente deles, não? Espero que a moral da história ainda esteja presente daqui a quatro anos. Ou antes. Ou depois.

3 Comments:

Blogger .desediu said...

muito bom, nem sabia do blog. adorei.

3:21 PM  
Anonymous Anônimo said...

O grande Rosa diz que 'o real não está nem na chegada nem na saída; se dispõe pra gente é no meio da TRAVESSIA.' ELA 'faz com que a platéia se interesse, se envolva, se emocione'. O que VALE é testemunhar, pelo menos, "uma boa performance do conflito." Concordo. Mas o encanto, mesmo, é no gerúndio.

2:11 PM  
Blogger trela said...

bem, então o elenco escalado é uma bosta. não funciona bem junto pois todos estão preocupados demais com a própria performance e acham que estão participando de um monólogo.

coisa que não aconteceu com a itália, visto que nenhum jogador parou pra ajeitar as meias.

5:44 AM  

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